Histórico da legalização da cannabis no Brasil

A discussão sobre o uso da cannabis para fins medicinais tem evoluído nos últimos anos, especialmente a partir das regulações propostas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela discussão do tema no Congresso Nacional, ainda que a passos lentos quando comparada com outros países (como, por exemplo, Canadá, Uruguai, Espanha, Holanda e alguns estados americanos) e que, inclusive, já permitiram o uso não só para fins medicinais, mas também para o uso recreativo, assunto específico que no Brasil ainda está longe de amadurecer.

O ponto de partida para compreender a situação da cannabis no Brasil é o ano de 2006, por meio da atual Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que previu em seu artigo 2º, parágrafo único, a possibilidade de a União autorizar o plantio, a cultura e a colheita de plantas vegetais como a maconha (cannabis sativa), exclusivamente para fins medicinais ou científicos.

 

No ano de 2014 foi aprovado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), por meio da Resolução nº 2.113, o uso compassivo do canabidiol para o tratamento de epilepsias de crianças e adolescentes refratárias aos tratamentos convencionais, prevendo uma série de obrigações tanto para os médicos prescritores quanto aos responsáveis legais dos pacientes.

 

No ano de 2016, a Anvisa permitiu o registro de medicamentos derivados da cannabis sativa em concentração máxima de 30 mg de tetrahidrocannabinol (THC) por mililitro e 30 mg de canabidiol por mililitro, motivado pela fase final do procedimento de registro do medicamento Mevatyl®.

 

Em vista dessas atividades normativas, no ano de 2017, por meio da RDC nº 156, a Anvisa incluiu a cannabis sativa na Denominação Comum Brasileira como planta medicinal, permitindo um manuseio mais claro e preciso na área da farmacopeia brasileira.

 

No ano de 2019, a Anvisa publicou a RDC nº 327, que trata sobre os procedimentos para a concessão de autorização sanitária para a fabricação e importação, bem como os requisitos para a comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e fiscalização de produtos de cannabis sativa para fins medicinais — de uso humano.

 

Atualmente em vigor, a RDC nº 327/2019 pode ser considerada a principal norma do setor, visto que permitiu avançar em pontos até então obscuros para fabricantes, importadores, médicos e pacientes, contribuindo para o aprimoramento do sistema. A partir disso, em 2021 a Anvisa aprovou dois novos produtos à base cannabis, os quais foram solicitados com fundamento na referida RDC: soluções de uso oral nas concentrações de 17,18 mg/mL e 34,36 mg/mL, com até 0,2% de THC, os quais deverão ser prescritos por meio de receituário tipo B.

 

Outro ponto fundamental da RDC nº 327/2019 é sua transitoriedade, pois a norma deverá ser revista em até três anos de sua publicação, que ocorreu em dezembro de 2019, conforme seu artigo 77, parágrafo único, o que deverá acontecer justamente nesse ano de 2022.

 

Paralelo à regulação pela Anvisa, o ano de 2021 ainda reservou a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei (PL) nº 399/2015, que propõe alterar o artigo 2º da Lei de Drogas, justamente para viabilizar o plantio, fabricação e a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta cannabis sativa em sua formulação.

 

O PL foi aprovado em regime de apreciação conclusiva pela comissão especial formada para tratar o assunto na Câmara dos Deputados e deveria seguir diretamente para o Senado Federal para discussão e votação nessa casa, mas houve a interposição de recurso por um grupo de deputados e agora o PL deverá ser votado em plenário.

 

Segundo dados da consultoria BDSA, especializada no mercado canábico, o mercado legal da cannabis, no ano de 2020, atingiu o valor de US$ 21,3 bilhões, correspondendo a um aumento de quase 50% em relação ao ano de 2019, e deve seguir aumentando à medida que cada vez mais países autorizam o uso da cannabis para fins medicinais e/ou recreativos, com previsão de atingir US$ 55 bilhões em 2026.

 

A expectativa para os defensores do uso medicinal continua sendo a possibilidade de autorizar a plantação da cannabis em território nacional para fins medicinais, o que certamente traria inúmeros benefícios aos país, como o desenvolvimento do agronegócio e toda sua cadeia de suprimentos; novos estudos científicos e novas tecnologias de medicamentos pela indústria; além da arrecadação de tributos e geração de empregos, mas, principalmente, na possibilidade de redução de custos e ampliação de tratamento médico aos inúmeros pacientes que hoje necessitam da cannabis e precisam importá-los de outros países.

 

Nesse cenário de polarização que o país vive atualmente, onde a discussão não tem avançado, manter e renovar a vigência da RDC nº 327/2019, por um novo prazo de três anos, parece razoável e proporcional, especialmente porque o tempo para isso previsto na lei seria até dezembro de 2022.

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